Siga-nos nas redes sociais:

Acessibilidade

AUMENTAR CONTRASTE

DIMINUIR CONTRASTE

Hora da prova: Educação infantil de BH passa por auditoria

12/05/2017

Clique na imagem e leia a reportagem

Crianças que frequentam a educação infantil de boa qualidade têm melhores resultados em testes de desenvolvimento e apresentam melhor desempenho nos anos iniciais do ensino fundamental. É o que afirma o documento “Parâmetros Nacionais de Qualidade para Educação Infantil”, publicado pelo Ministério da Educação (MEC), e que está sendo cada vez mais levado em conta pelos sistemas educacionais e pela sociedade. Neste sentido e diante da importância e criticidade do tema, o Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCEMG) realizou inspeções em 20 unidades de educação infantil na capital mineira, como parte da auditoria operacional que investiga a qualidade da educação oferecida pelo município às crianças em seus primeiros anos de vida. 

A palavra auditoria vem do latim audire e significa ouvir. No entanto, os técnicos do Tribunal de Contas fizeram mais que  simplesmente ouvir. Eles fizeram medições dos espaços das crianças, tiraram fotos, checaram a estrutura, aplicaram questionários aos professores, entrevistaram coordenadores pedagógicos, orientadores e responsáveis pelas unidades de ensino. Depois da realização dessas inspeções, os dados colhidos serão consolidados em um relatório. Todo o material passará por uma análise técnica do Tribunal para verificar se atendem às metas 1 e 18 do Plano Nacional de Educação (PNE) e às diretrizes do Conselho Municipal de Educação. A Meta 1 do PNE prevê “universalizar, até 2016, o atendimento escolar da população de 4 e 5 anos e ampliar, até 2020, a oferta de educação infantil de forma a atender 50% da população de até 3 anos”. E a Meta 18 “assegurar, no prazo de dois anos (até 2016), a existência de planos de carreira para os profissionais do magistério em todos os sistemas de ensino”. 

Os técnicos do TCEMG Antonieta Jardim e Antônio de Pádua verificaram as estruturas e o corpo profissional das unidades de ensino (Foto: Karina Camargos Coutinho)

Depois disso, o relatório dos técnicos se torna um processo e é distribuído para um relator do Tribunal de Contas, que encaminha o documento para a Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) se manifestar. O processo retorna, então, para nova análise dos técnicos. E um relatório final é elaborado e encaminhado para julgamento por um dos colegiados do TCEMG. As recomendações à Prefeitura, que forem aprovadas, serão monitoradas pelo Tribunal, como contribuição para a melhoria das políticas públicas auditadas.

Essas ações de fiscalização e controle do Tribunal não serão as únicas. Nos próximos dois anos (2017-2018), a prioridade da gestão do presidente do TCEMG, Cláudio Couto Terrão, é o controle da educação pública. Para isso foi criado o projeto “Na ponta do lápis: a Escola na formação, o Tribunal na fiscalização”.  O projeto “Na Ponta do Lápis” também tem como finalidade fazer com que o Tribunal de Contas atue de forma pedagógica, identificando as oportunidades de melhoria e sinalizando para o Estado e os municípios mineiros - por meio da criação de um sistema de alerta - o ritmo de cumprimento das metas do Plano Nacional de Educação (PNE) e das estratégias firmadas no documento.

A creche Nossa Senhora do Carmo, no Vila Oeste, atende 98 crianças em horário integral (Foto: Karina Camargos Coutinho)

Caso seja necessário, recomendações aos gestores responsáveis e envolvidos serão feitas e seus cumprimentos serão monitorados. Representações, Termos de Ajustamento de Gestão (TAG) e determinações de apresentação de planos de ação e de monitoramento também são esperados.

Dez unidades municipais de educação infantil (Umeis) e mais dez creches de Belo Horizonte foram vistoriadas pelos analistas do Tribunal. As visitas começaram em abril deste ano e as unidades de ensino visitadas atendem a crianças de 0 a 6 anos. A escolha das instituições de ensino foi feita pelo critério de região, atendendo a todas as partes da capital mineira. O Tribunal checou in loco, fundamentalmente, a infraestrutura dessas redes de ensino e a valorização do quadro de profissionais. Analisou, também, documentos enviados pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) sobre a gestão e o financiamento da educação infantil. 

Naila Mourthé, coordenadora do Projeto Na Ponta do Lápis, e as crianças da Umei Professora Acidália Lott (Foto: Karina Camargos Coutinho)

Segundo o coordenador de Auditoria Operacional do TCEMG, Ryan Pereira, a auditoria se propõe a analisar “em que medida as crianças, no município de Belo Horizonte, têm acesso garantido à educação infantil; se estudam em unidades com infraestrutura que atende aos parâmetros mínimos de qualidade e se os profissionais que as atendem são devidamente valorizados”, ou seja, se aderem às metas e estratégias contidas no PNE. Para ele, os “dois grandes desafios às administrações municipais se referem à ampliação da oferta de vagas e à elevação dos padrões de qualidade”. 

De acordo com Ryan, foi considerado pertinente pelo TCEMG realizar uma auditoria operacional para observar como a Meta 1 está sendo implementada no município de Belo Horizonte, analisando as dimensões de “gestão”, “financiamento”, “professor” e “infraestrutura”.  A adequação da rede física de escolas públicas, a ampliação da oferta de vagas e a realização, pelos municípios, da chamada busca ativa de crianças em idade para começar a frequentar a pré-escola são algumas das estratégias para o alcance da Meta 1. 

A creche Nossa Senhora do Carmo, do Vila Oeste, foi reformada recentemente, mas por meio do programa “Jornada Solidária” e não por recursos próprios. A creche está localizada na região administrativa do Noroeste da cidade de Belo Horizonte (Foto: Karina Camargos Coutinho)

A Lei nº 13.005/2014 aprovou o PNE, composto por 20 metas, “orientadas para enfrentar as barreiras para o acesso e a permanência; as desigualdades educacionais em cada território com foco nas especificidades de sua população; a formação para o trabalho, identificando as potencialidades das dinâmicas locais; e o exercício da cidadania”, conforme cartilha do MEC sobre o tema. Para a Meta 1, foram definidas 17 estratégias para alcançá-la, como por exemplo, a adequação da rede física de escolas públicas, a ampliação da oferta de vagas e a realização, pelos municípios, da chamada busca ativa de crianças em idade para começar a frequentar a pré-escola. 

Como foi a auditoria nas creches e Umeis

Na visita à creche comunitária Nossa Senhora do Carmo, no bairro Vila Oeste (região Noroeste), os técnicos do TCE se depararam com uma instituição conveniada à prefeitura, mas que ainda enfrenta problemas para a sua manutenção. As 98 crianças, de 0 a 6 anos, ficam no estabelecimento de 7 às 16h, e recebem estímulos de aprendizado, alimentação e cuidados por todo esse período. 

De acordo com a coordenadora administrativa da creche, Florenice de Oliveira Pinto, o repasse da Prefeitura custeia salários (abaixo do piso), contas de manutenção do local e merenda escolar (muitas vezes, insuficiente), já que as crianças fazem todas as refeições do dia no local. A creche foi reformada recentemente, mas por meio do programa “Jornada Solidária” e não por recursos próprios. 

Professores da umei Acidalia Lott respondem ao questionário aplicado pelos técnicos do Tribunal de Contas (Foto: Karina Camargos Coutinho)

A visita do TCE na unidade de ensino acendeu uma luz no fim do túnel para a coordenadora da casa, que disse estar confiante de que isso poderá ajudar a melhorar a qualidade do serviço prestado. “Em 20 anos de creche, é a primeira vez que recebemos uma visita assim. Estou certa que isso irá nos ajudar a crescer”, afirmou Florenice Pinto. Os técnicos do Tribunal inspecionaram cada ambiente da creche, medindo espaços, colhendo informações sobre tomadas, pisos, pias, mobiliário, ventilação, quantidade de alunos, chaves nas portas, álcool gel, brinquedos, salas de aula, ou seja, tudo que envolve o aprendizado e bem-estar das crianças. 

Outro local auditado foi a Unidade Municipal de Educação Infantil (Umei) Professora Acidália Lott, localizada no bairro Paulo VI, região Nordeste de Belo Horizonte. A unidade de ensino é mantida diretamente pela PBH. Nela, trabalham cinco professores em regime de meio horário. “As mães deixam as crianças em outro local para completar o horário de expediente delas”, disse a vice-diretora do local, Marcia Mendonça.

Segundo a presidente da creche de Ângelis, 30% das crianças matriculadas encontram-se em situação de vulnerabilidade social (Foto: Karina Camargos Coutinho)

Perguntada sobre uma melhoria que faria uma diferença na vida das crianças, a direção da Umei salientou que gostaria de um espaço maior para as crianças, com a instalação de um parquinho recreativo.  Para que esta Umei funcionasse, a Prefeitura desapropriou e adaptou uma grande casa. Mesmo assim, a Umei não possui extintores e mangueiras de incêndio. Existe um elevador para acesso de deficientes, porém não há como circularem dentro das dependências por conta do espaço reduzido. De acordo com a vice-diretora, a comunidade ajuda muito na solução de problemas que surgem, fazendo mutirões e promovendo campanhas.

Na opinião de uma professora e pedagoga do local, as escolas deveriam ter um projeto de ação a médio e longo prazo. “A quantidade de designações e a rotatividade de funcionários impedem que projetos sejam executados com êxito”, explicou. A Umei foi fundada em 2011 e atende a 196 crianças divididas nos turnos da manhã e tarde. 

Na creche da Oficina Escola de Ângelis, localizada no bairro Primeiro de Maio, região Norte de Belo Horizonte, os dirigentes encontram dificuldades para a manutenção do local. “Nós encontramos dificuldades de todas as ordens”, afirmou Juselma Coelho, presidente da instituição. Os salários estão abaixo do piso nacional e o dinheiro que a PBH manda é destinado a pagar os salários dos professores e pagar as contas de custeio. De acordo com a instituição, a merenda é enviada in natura. “Precisamos colocar câmeras aqui e tivemos que nos virar para isto. Além disso, tivemos que ampliar duas salas de aula e mobiliá-las sem ter como arcar com isso”, afirmou a direção da casa. Juselma conta que a instituição tem uma verba de R$1.500 para arcar com outros gastos que possam vir a acontecer, porém este valor não pode ser utilizado para obra. Daí, a dificuldade de fazer as melhorias necessárias. 

Crianças da Umei Professora Acidália Lott (Foto: Karina Camargos Coutinho)

De acordo com ela, a instituição tem que “fazer milagre” para se manter.  Ela conta que, basicamente, a creche vive do repasse da PBH e de doações. Os problemas enfrentados são referentes à manutenção do prédio e à alimentação das crianças – muitas vezes incompleta. De acordo com ela, os professores fazem mutirão e ajudam nas reformas da cozinha, na aquisição de grades para as janelas, na reforma de pisos e cerâmicas das salas de aula. Os pais também ajudam, mas suas contribuições não passam de R$1 mil anuais e são feitas de forma espontânea. Segundo a presidente da creche, 30% das crianças matriculadas encontram-se em situação de vulnerabilidade social. Ela conta que recentemente a PBH só autorizou a compra de cortinas para as salas de aula porque as crianças estavam sendo castigadas pelo sol. 

A procuradora do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (MPCMG), Cristina Melo, esteve presente na visita à creche Oficina de Ângelis. “O MPC participa dando sugestões à área técnica”,  disse. O MPC é órgão auxiliar do Tribunal. Como os demais ramos do Ministério Público, o MPC pode atuar, tanto denunciando irregularidades ou ilegalidades, quanto como órgão que intervém, oficiando como representante da sociedade na relação jurídico-processual que se desenvolve no âmbito dos tribunais de contas. A procuradora Cristina Melo visitou também a Umei Manacás, situada no bairro Jardim Paquetá. 

A procuradora do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas (MPCMG), Cristina Melo, visitou a creche oficina de Angelis (Foto: Karina Camargos Coutinho)

Recentemente, a procuradora fez uma manifestação, em sessão da Primeira Câmara do TCEMG, sugerindo aos conselheiros relatores que façam recomendações nos pareceres prévios da prestação de contas do Chefe do Executivo para cumprirem as metas 1, 9 e 18 do Plano Nacional de Educação, que “são as metas consideradas prioritárias pelo Instituto Rui Barbosa (IRB) e Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon)”, disse. A Meta 9 prevê “elevar a taxa de alfabetização da população com 15 anos ou mais para 93,5% até o ano de 2015 e, até o final da vigência do PNE, erradicar o analfabetismo absoluto e reduzir em 50% a taxa de analfabetismo funcional”. Na visão dela, o TCEMG pode exercer ação pedagógica induzindo a execução do plano e contribuindo com o seu aperfeiçoamento. Além disso, pode atuar de forma repressiva, se for o caso. 

Visão geral do ensino infantil na capital

De acordo com dados da Gerência de Coordenação da Educação Infantil da Secretaria Municipal de Educação, de 2016, em Belo Horizonte existiam 127 Unidades Municipais de Educação Infantil (Umeis), 13 Escolas Municipais de Educação Infantil (Emeis) e 14 Escolas de Ensino Fundamental com turmas de educação infantil (Emefs). As 

creches parceiras, ou seja, as instituições da rede conveniada de educação infantil somam 194. No total, são 154 instituições da rede própria e 194 da rede conveniada, totalizando 348 instituições com atendimento à educação infantil na capital mineira.

Ainda de acordo com a Secretaria Municipal de Educação, em 2016, 17.122 crianças foram atendidas nas creches da rede própria e outras 21.097 atendidas na pré-escola da rede própria, totalizando 38.219 crianças atendidas pela rede. Pela rede parceira, 13.638 crianças foram atendidas na creche e outras 9.885 na pré-escola, totalizando 23.523. No atendimento total à educação infantil, 30.760 crianças frequentaram as creches e outras 30.982 frequentaram a pré-escola, somando 61.842 crianças.

Clique aqui e leia a reportagem de capa da edição nº 27 da Revista Contas de Minas do TCEMG


Karina Camargos Coutinho / Coordenadoria de Jornalismo e Redação